CATÓLICOS EM PRIMEIRA LINHA
Nestes últimos tempos a Igreja Católica tem aparecido na imprensa por causa de escândalos que tiveram como protagonistas alguns padres e religiosos. Não dá, infelizmente, para esconder ou justificar essa realidade de pecado. Diante de certas situações, devidamente comprovadas, não nos resta que entregar os agressores à justiça, pedir perdão às vítimas e reparar os danos.
Mas essa maré negativa, potencializada por uma campanha mediática inflamada por grupos e pessoas tradicionalmente hostis à missão da Igreja, acabou submergindo o testemunho bonito daquela multidão de católicos que se mantém fiéis à proposta de Jesus Cristo e que, com sua adesão aos valores do Evangelho, se tornam fermento de vida nova na cotidianidade. São estes homens e mulheres, quase sempre desconhecidos ao público e desprezados pela grande imprensa, que escrevem as páginas mais bonitas da história da Igreja e que dão conta da presença atuante do Espírito no seio dela.
Não dá para falar de todos estes protagonistas, mas permito-me apresentar brevemente alguns deles. Em fazer isso não quero dar a impressão de estar fazendo apologia da Igreja Católica, mas pretendo ressaltar exemplos de vida que, além de nos dar muito orgulho, estão deixando um rasto significativo na nossa história. Trata-se de cidadãos e cidadãs que, inspirados nos valores do evangelho e na Doutrina Social da Igreja, trabalham para tornar o Brasil um país verdadeiramente independente, justo, pacífico e solidário.
Em primeiro lugar, quero lembrar o coronel Anselmo Lima, comandante geral da Polícia Militar. Tive a oportunidade de conhecê-lo logo depois de sua posse nesse alto cargo na corporação. Logo me impressionou por sua humildade. Católico praticante, como ele mesmo costuma dizer, revela uma grande sensibilidade para com a cultura da paz e dos direitos humanos. Homem de diálogo e preocupado em preservar a integridade física e moral das pessoas, sobretudo dos mais humildes, é o primeiro comandante geral a procurar o Conselho Estadual dos Direitos Humanos para estudar alternativas não violentas nas eventuais operações de reintegração de posse que suas tropas, por dever de ofício, são obrigadas a cumprir. Não tem se furtado a ir pessoalmente até os acampamentos para conversar com o povo. Sua atuação à frente da Polícia Militar nos enche de esperança. Mesmo sabendo de eventuais resistências internas, seu desempenho torna possível a concretização de uma polícia cada vez mais qualificada e afinada com o respeito pela vida e dignidade humana.
E que dizer de Francisco de Paula Neto? O homem tem 81 anos, mas o seu entusiasmo dá de dez a zero em qualquer garoto. Há 31 anos trabalha voluntariamente na Pastoral Carcerária. Passou por vários presídios. Atualmente visita o Média I em Viana. Com chuva ou calor, lá está ele toda semana. É difícil faltar. Os internos têm muito carinho e respeito por ele. Alguém lhe sugeriu que se aposentasse por causa da idade. Foi como lhe dar uma facada nas costas. O trabalho de evangelização dos presos é sua razão de vida. Recentemente convidou seus amigos e familiares para uma celebração de ação de graças. Foi comovente ver sua emoção na hora de contar os momentos mais importantes de sua atuação. Francisco tem razão de ficar permanentemente sereno. Quando Deus o chamar, seu lugar no Céu está garantido. Enquanto uns ficam na conversa, Francisco, fazendo jus ao seu seráfico padroeiro Francisco de Assis, vai toda semana “abraçar os leprosos nos presídios”, isto, é vai ao encontro de seres humanos rejeitados pela sociedade para proclamar o Evangelho da Misericórdia.
O terceiro que quero lembrar é católico de carteirinha. Chama-se Severino Ramos. É Defensor Público concursado. É responsável pelo acompanhamento dos adolescentes a quem é atribuída autoria de ato infracional. Este é batalhador. Seu trabalho não tem nada a ver com o incentivo à impunidade, mas é uma prestação de serviço gratuita aos adolescentes que, por razões econômicas, não teriam acesso a assistência jurídica durante o processo. É uma forma concreta de viver a evangélica opção preferencial pelos pobres. Ele luta incansavelmente por uma justa aplicação e efetiva execução das medidas socioeducaitvas. Para ele não tem tempo ruim. A qualquer hora está disponível para defender os direitos humanos dos adolescentes. Sua indignação, às vezes, o leva a ser impetuoso, mas nunca desrespeitoso. Sua firmeza na defesa da vida e da dignidade humana dos adolescentes privados de liberdade está incomodando muita gente. Há sempre alguém que o processa ou que ameaça persegui-lo politicamente. Mas ele não arreda pé. A Pastoral do Menor é grata ao seu compromisso intransigente e o apóia incondicionadamente. Qualquer movimento destinado a destituí-lo de sua função será interpretado como uma perseguição contra as pessoas que encontram na Doutrina Social da Igreja sua inspiração. A ele vai nossa total solidariedade.
Enfim, por último quero homenagear a companheira Marta Falqueto. Dela vou falar com um pouco mais de orgulho, porque, em parte, é “cria nossa”. É fruto da generosidade dos pais, mas também da paixão missionária dos missionários combonianos que, por mais de trinta anos, estão servindo ao povo da Serra.
Moradora da Paróquia São José Operário de Carapina, é secretária executiva do Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Serra. Atualmente coordena o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos. Suas energias parecem inesgotáveis. Onde há uma violação aos direitos humanos, aí ela está, como incansável cirineu, sempre pronta a ajudar os outros a carregar a cruz. Ela sabe muito bem o que isso significa, porque desde nova, cuida com uma amorosidade e serenidade incomuns da filha Marina, que precisa de atenções especiais. Poderia ter se trancado na depressão ou se entregue à lamúria, mas não foi isso que ela fez. Preferiu o caminho da luta e da solidariedade com aqueles que sofrem. A sua experiência pessoal a levou a ser mestra da caridade. Recusou até convite a ocupar cargos públicos com bons salários por medo que o poder a fascinasse e a levasse a perder essa íntima e pessoal ligação com as pessoas humildes. Apesar das divergências ideológicas, não há quem negue sua grande e generosa lição de vida.
Felizes os passos de quem anuncia a paz, proclamava o profeta Isaias. Feliz também a Igreja que pode contar com filhos e filhas como estes. Seu exemplo estimule outras pessoas a se comprometerem cada vez mais pelo Evangelho e os outros a reconhecer o papel que a Igreja tem na construção de uma sociedade mais justa e mais fraterna.
Padre Saverio Paolillo (Pe. Xavier)
Missionário Comboniano
Pastoral Carcerária e Pastoral do Menor da Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo
Rede AICA – Atendimento Integrado à Criança e ao Adolescente
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